''O bem do povo''

17 de janeiro de 2017

Diário de Pernambuco destaca a força de Santa Cruz do Capibaribe no Polo de Confecções


Cidade do Agreste responde por 30% da produção no estado e tem marcas espalhadas pelo país


Santa Cruz é sinônimo de polo têxtil

Cidade do Agreste responde por 30% da produção no estado e tem marcas espalhadas pelo país

Santa Cruz do Capibaribe, cidade onde nasceu a feira da sulanca, vive o auge da sua influência no cenário de confecções brasileiro. As marcas locais se espalharam pelo país, principalmente no Nordeste, Norte e Centro-Oeste. O que pouca gente sabe, até mesmo entre os pernambucanos, é que, sozinha, Santa Cruz responde por 30% de tudo o que é produzido no Polo Têxtil de Pernambuco, o que representa RS 2,4 bilhões por ano do Produto Interno Bruto (PIB) do estado.

Considerando que o nosso polo é o segundo maior do país, perdendo apenas para São Paulo, é fácil chegar à conclusão de que Santa Cruz do Capibaribe é a maior cidade produtora de confecções em malha de todo Norte e Nordeste brasileiro e caminha para chegar, em 2020, à maior produção de malha do Brasil, segundo dados da própria prefeitura. Nem a seca afeta a produção local, já que a maioria das fábricas de Santa Cruz não depende de água para lavagem do jeans, como a vizinha Toritama. A cidade é quase um oásis produtivo em meio ao deserto do Agreste pernambucano. Até a feira da sulanca, que ficou conhecida em todo o país, foi a primeira a se modernizar. Há dez anos se transformou no Moda Center Santa Cruz, hoje, o maior centro atacadista de confecções do Brasil. Uma em cada cinco cidades pernambucanas possui empreendedores no espaço, que reúne 11 mil boxes, de 54 localidades produtoras. A gestão é feita pelos próprios feirantes, com recursos do pagamento de taxas mensais.

Em sua trajetória, o Moda Center vem registrando um aumento de 10% nas vendas por ano. Índice repetido no ano passado e uma estimativa de crescimento entre 8% e 10% este ano também, independentemente da retração econômica. O espaço já recebeu, inclusive, mais de 140 mil pessoas espalhadas em 120 mil metros quadrados de área construída em apenas dois dias de feira. Ao todo, são 150 mil empregos diretos gerados no local. Agora, a feira e suas principais marcas olham para o futuro e encaram a crise econômica com investimentos e inovação.

“Já dominamos o mercado C, D e E. Em 2017, queremos consolidar nossa atuação no mercado B e, para isso, precisamos de formalização, automação e profissionalização das empresas locais. Estes são os maiores desafios de Santa Cruz e de todas as cidades do polo têxtil”, afirma Allan Carneiro, síndico do espaço. Segundo ele, a formalização está sendo agilizada com a sala do empreendedor, montada em parceria com o Sebrae dentro do shopping. “Em três anos, já tivemos mais de 1,2 mil inscrições na categoria microempreendedor individual.” Apesar disso, grande parte dos comerciantes de Santa Cruz continua na ilegalidade. O que desfavorece o crescimento das marcas pois, com a formalização, as empresas conseguem recursos para investir no negócio, em linhas de crédito do Banco do Nordeste e do BNDES, e contratar mão de obra qualificada. Vale ressaltar que quase 80% de toda a mão de obra capacitada recebe treinamento na escola do Senai no município.

Já a automação, o desafio número dois, precisa de investimentos dos empreendedores locais em máquinas e softwares e mão de obra especializada. E tudo isso depende muito da formalização, uma vez que os investimentos são altos e, para tal, os empresários precisam de crédito. Por fim, Santa Cruz enfrenta ainda a necessidade de profissionalizar as fábricas, para atender com produtos adequados a uma exigente classe B e encarar o aumento nas vendas do varejo, que chega a 30% da produção. “Acreditamos que a tendência do Moda Center é vender mais para o consumidor final, continuando também com seus clientes de atacado”, diz Allan Carneiro. “Com a crise, as pessoas estão correndo atrás de preços baixos para manter o consumo e é justamente isso que oferecemos”, reforça.

Rota do Mar de olho no Nordeste

Com uma produção de 130 mil peças por mês, comercialização em todos os estados brasileiros e vendas expressivas em Portugal, Panamá e África do Sul, não dá para imaginar que a trajetória da Rota do Mar começou com a venda de picolés. Esse foi o primeiro “empreendimento” de Arnaldo Xavier, ainda criança, criador e presidente da marca. Hoje, a Rota emprega 800 pessoas, tem uma fábrica de 22 mil metros quadrados, seis outras unidades produtivas, cinco grandes lojas em Santa Cruz. do Capibaribe, Toritama e Caruaru e deverá iniciar no próximo ano um plano ambicioso de abrir mais 30 unidades em todo o Nordeste até 2022.

“Queremos ampliar nossa atuação no varejo e chegar a locais onde já temos uma grande demanda, como a Paraíba. Ao mesmo tempo, chegar também onde nunca estivemos e, por isso, devemos iniciar nossas vendas online em 2017”, revela Xavier. O site já está pronto e foi resultado de um investimento de RS 300 mil. Será um dos primeiros projetos, nesta escala, de comércio digital de todo o polo. Os planos são reflexo de investimentos realizados no ano passado. Em 2016, a Rota aportou mais de RS 3,5 milhões em tecnologia e maquinário.

Para Xavier, porém, isso não é o bastante. O empresário quer mais. Ainda neste mês, deve começar a montar sua própria fábrica de energia solar, com um investimento de RS 500 mil deverá suprir a necessidade do setor de estamparia da indústria. “Este ano (2016), vamos fechar sem perdas, mas sem crescimento. É uma boa marca. E, com estes investimentos, estamos garantindo o crescimento de 2017. Pelo menos, 10%”, completa.

A qualidade de visionário Arnaldo Xavier já provou que tem. Ainda em seu início, após vender picolé e ajudar a mãe na confecção dela, aos 19 anos ele costurou uma bermuda para si próprio. Satisfeito com a peça, se juntou à sua mãe para confeccionar mais roupas. Ela fazia a parte feminina e ele, a masculina. O negócio foi crescendo e percebeu que o estacionamento dos clientes da antiga Feira da Sulanca, na cidade, chegava cada vez mais perto da casa da sua mãe. “Foi quando eu propus para ela transformarmos a sala em uma loja. Duas semanas depois, os ônibus de turistas já estavam parando na nossa porta. Éramos o primeiro negócio que eles viam e, em pouco tempo, a casa toda estava ocupada por nosso estoque”, relata.

A marca Rota do Mar só surgiu em 1996 e, com esse nome, o empresário definiu o perfil da empresa: roupas para o clima ensolarado de Pernambuco e com um toque de praia. Nestes 20 anos, porém, nem tudo foram flores. “Já quebrei duas vezes. Mas posso afirmar que o bom empreendedor é resiliente.” Hoje, a Rota do Mar, responsável por cerca de 20, de toda a produção de Santa Cruz do Capibaribe.


Descoberta do mercado infantil

Com peças entre R$ 8,90 e R$ 29,90, a Zuzinha Kids, criada em 1998, começou nos fundos de uma casa comum do centro de Santa Cruz, quando o pai de Allan Carneiro trocou a produção de redes pelas confecções. Allan ajudava costurando, quando chegava da escola. Foi quando ele percebeu que ninguém estava fazendo moda infantil na cidade de forma especializada e nasceu aí a ideia de um negócio neste perfil. Hoje, a marca tem 30 funcionários e 30 colaboradores terceirizados, toda a produção é informatizada e o resultado são mais de 20 mil peças por mês entre bermudas, camisas e shorts infantis. Há clientes em todos os estados do Nordeste e em São Paulo e, no futuro, destinos internacionais como Cabo Verde já estão na programação.

“Acho que, para crescer fora do país temos que atender muito bem o mercado daqui. Queremos a produção cada vez mais automatizada, queremos eficiência no uso dos materiais e também estamos trabalhando as formas de comercialização para atender melhor nosso cliente que vem aqui. Depois disso, podemos pensar em exportar”, reforça Allan. Ele ressalta ainda que as peças mais vendidas são camisas polos, camisas simples, moletons, bermudas e calçados, nesta ordem. “A roupa infantil tem um diferencial que é a exigência por conforto máximo. Por isso, o tecido, a modelagem, o desenho e as costuras recebem tratamento especial para não agredir o corpo das crianças. Esse cuidado, faz a diferença. Só trabalhamos, por exemplo, com 100% algodão e tudo passa por uma vistoria completa no final”, completa.

Em 2017, a marca pretende ampliar a produção e trabalhar com novos canais de venda. “O maior desafio da roupa infantil é que temos por obrigação agradar a criança e a mãe, então também devemos reforçar nosso time interno e ampliar nossa carteia de produtos. As peças infantis têm que ser lúdicas e a mãe tem que achar vantagem. Acho que a produção de Santa Cruz agrega muito a esse mercado, porque é algo que as pessoas podem investir o dinheiro, que é barato. Criança muda muito de tamanho e perde muita roupa, então o preço faz a diferença da escolha”, explica o empresário.

Allan revela ainda que, este ano, investiu R$ 350 mil em máquinas novas, buscando sempre modernizar a fábrica. “Automatizando a produção, o que também é um desafio para o polo, a gente diminui os erros e, consequentemente, o desperdício”, completa. Ele reforça, contudo, que, apesar de ser o coração do Polo Têxtil de Pernambuco, falta mão de obra qualificada em Santa Cruz. “Hoje, o que nos salva é a escola do Senai. Os meninos aprendem a mexer nos programas mais modernos, a trabalhar com softwares de desenho. A profissionalização nos poupa tempo e dinheiro e todo o polo precisa disso para melhorar a produção.”


Conheça o Polo em Santa Cruz

 CURIOSIDADES

A primeira produção de Santa Cruz do Capibaribe foi de alpercatas e colchas com retalhos de tecido, em 1930;

As confecções da cidade começaram quase por acaso, quando um fabricante de colchas recebeu retalhos maiores que vinham, na época (1930) do Recife, Olinda e Camaragibe. Ele resolveu fazer shorts dos retalhos e deu início à primeira produção de roupas da cidade;

O termo sulanca foi criado na cidade de Santa Cruz do Capibaribe para identificar as peças produzidas com helanca vinda do Sul do país (Sul + helanca = sulanca), maioria nas fábricas de confecções, em 1950;

As chamadas feiras da sulanca tiveram início também em Santa Cruz, em 1960, quando as ruas Siqueira Campos e Avenida João Francisco Aragão começaram a abrigar bancos de madeira com peças de fabricantes locais. O nome na época, era de Feira de Capibaribe.

NÚMEROS

O Brasil é o 5º maior produtor de têxtil do mundo, perdendo apenas para China, Índia, Estados Unidos e Paquistão;

O Polo Têxtil de Pernambuco é o segundo maior do país, perdendo apenas para o Polo Têxtil de São Paulo;

Todas as 187 cidades do estado produzem e comercializam no polo;

O Polo arrecada U$ 8 bilhões por ano, agrega 32 mil unidades produtivas e recebe até oito milhões de visitantes por ano;

O Agreste pernambucano corresponde a 77% da produção de todo o polo sendo: 38,1% de Santa Cruz do Capibaribe, 24,1% de Caruaru e 14,8% de Toritama;

Os principais estilos comercializados são moda praia, fitness, bike, jeans, social, feminina, masculina, vestidos de noiva, enxovais, cama, mesa, banho, plus size, surf wear, moda íntima e infantil.


De carona no nome e na moda

Um erro de etiqueta deu à marca Camboriú, uma das mais vendidas do Polo Têxtil de Pernambuco, o nome que tem hoje. A encomenda era para Verão e Cia e a fabriqueta de etiquetas só tinha Camboriú no dia da entrega. O nome ficou e pegou. A ideia de fabricar moda praia começou em 1993, quando Edjane Araújo, que era secretária, e seu marido, José Cláudio Barbosa de Araújo, que já trabalhava com tecidos, mudaram-se de Afogados da Ingazeira para Santa Cruz do Capibaribe. Lá, envolveram-se com as confecções, como praticamente todos da cidade.

Hoje, a Camboriú vende para todo o Brasil, foi uma das pioneiras do polo em vendas online, produz cerca de 35 mil peças por mês, tem 80 funcionários e foi a primeira marca do estado a se especializar em “moda bike”, para ciclistas, e apresentar coleções com este tema. Além de tudo, a marca também trabalha com franquias, sendo uma das únicas do polo a entrar neste modelo de negócio.

“Começamos fazendo moda infantil, lingerie, moda feminina. Eu era auxiliar de produção. Aí fabricamos pela primeira vez sungas. A demanda foi grande, porque estava perto do verão e resolvemos focar em moda praia e fitness’’, resume Edjane. A ampliação do mercado e a elevação do desenho das peças foi fruto de um quadro montado a muito custo e no decorrer de vários anos. “Quando começamos, a mão de obra era primária, as pessoas faziam o básico. Hoje, temos um designer e um estilista e, ainda assim, sempre estamos buscando pessoas formadas junto ao Senai ou que tenham algum curso técnico feito em outras cidades”, revela.

Uma prova dos bons resultados dessa preocupação com o time é a aceitação da marca no Brasil, com vendas expressivas na Bahia, Sergipe, Piauí, Alagoas, Paraíba, Maranhão e forte presença no Rio de Janeiro, estado onde biquíni é quase cartão-postal. Para conquistar mais vendas no Sudeste e Sul do país, recentemente a Camboriú lançou uma loja online, que está em formato soft open (ainda sendo testada) e foi resultado de um investimento de R$ 15 mil. A marca também investiu mais R$ 15 mil em novas máquinas no ano passado, uma preparação para crescer em 2017. “Não vamos crescer e nem ter perdas em 2016, mas estamos positivos quanto aos próximos anos. A reação vai ser lenta, mas vai acontecer e queremos estar preparados”. Camboriú tem lojas físicas em Caruaru e Santa Cruz e começa, a trabalhar com franquias.

Força no atacado de confecções para público C, D e E

Com uma das maiores produções de malhas do Nordeste, a Joggofi nasceu no início da década de 1990, quando José Gomes Filho (Jo Ggo Fi), que era do interior de São Bento-PB, chegou a Santa Cruz. Antes, ele trabalhava como contínuo em um banco, mas percebeu potencial para confecções assim que chegou na nova cidade e logo envolveu toda a família no trabalho. Eram calcinhas, bermudas, blusas e camisas.

Hoje, a produção da empresa chega a 110 mil peças por mês, as calcinhas saíram da carteia de vendas e deram lugar a camisetas, vestidos e regatas, tudo de malha. Agora, a marca abastece todos os nove estados do Nordeste com produtos voltados ao público C. D e E. A fábrica atual tem mais de mil metros quadrados e 60 funcionários. Uma nova unidade fabril já está a caminho com cinco mil metros quadrados. A fábrica nova irá abrir 200 vagas de trabalho e aumentará a produção da empresa em 100%. Ainda este ano, a Joggofi projeta seu próprio parque de energia solar. O forte da Joggofi ainda é o atacado, sendo este o destino de 99% da produção, que é revendida em toda a região.

Monnika Marikinha, filha do criador da Joggofi, diretora operacional da marca, é um exemplo de como o polo está tentando se profissionalizar. Ela aposta em continuar o legado da família e está se preparando para isso. “Não é só ir todos os dias para a fábrica. Tem que saber costurar, entender todas as etapas da produção e distribuição e ainda se preparar formalmente e continuar com os treinamentos”.
A diretora ressalta também que as redes sociais são o novo campo de expansão do polo. “A gente tem vendido massivamente através do WhatsApp. Os clientes querem todo dia foto de roupa nova, então essa tecnologia está mudando as operações dentro das empresas daqui. Lançar coleção, por exemplo, está ficando ultrapassado porque, no WhatsApp, todos os dias podem ser mostrados modelos novos. É uma nova fase para todo o polo têxtil.”


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